domingo, 10 de fevereiro de 2008

Por essa, "as oposições" não esperavam

Há duas frentes de oposição ao Governo Federal no Brasil.

A primeira delas pode ser chamada de legítima: é aquela representada majoritariamente pelo DEM e pelo PSDB, além do PPS e, em menor escala, pelo PSOL, sendo que a deste último é um tipo de oposição diferente, marcada por motivos diversos aos daqueles grupos que realmente lutam pela – ou estiveram na – chefia do governo brasileiro.

A outra oposição pode ser chamada de ilegítima: é a representada pelos mais poderosos grupos de mídia do país. Ao contrário dos integrantes dos partidos políticos acima mencionados, os grandes jornais e revistas ou a maior rede de televisão não foram eleitos diretamente pela vontade dos milhões de pessoas que desaprovam o governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva; tal oposição, entretanto, é por diversas vezes mais barulhenta e, não raro, mais organizada.

Ambas parecem ter ficado perplexas com alguns dos desdobramentos da chamada “farra” dos cartões corporativos.

A antecipação por parte da liderança do governo em colher assinaturas para uma CPI pegou muita gente de surpresa. Há um detalhe no pedido formulado pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá: a investigação tem que ser ampla o suficiente para contemplar o período do governo de Fernando Henrique Cardoso, quando se iniciou o uso dos famigerados cartões.

Viram-se na oposição algumas manifestações, que, não obstante a marca do cinismo que ostentam, são por demais didáticas para aqueles que acompanham os acontecimentos políticos: segundo o UOL, o Senador Demóstenes Torres, do DEM, disse que uma CPI que pretende ser tão ampla já está fadada a acabar em pizza, como que já insinuando um grande acordo para ninguém sair chamuscado. Ora, se o DEMocrata estiver certo, deve ser porque sabe que o governo do antecessor do presidente Lula teria muito o que temer na investigação. Aliás, se o leitor permite, cabe uma pergunta ingênua: se o senador goiano realmente estiver certo, não seria um motivo a mais para que a CPI ocorresse, obrigatoriamente, nos termos apresentados pela solicitação governista?

Ainda na mesma linha, o Deputado Antônio Carlos Pannunzio, do PSDB paulista, em mensagem publicada no sítio Conversa Afiada, de Paulo Henrique Amorim, declarou que uma CPI de verdade tem que ser apresentada pelo grupo adversário, pois quando os próprios investigados se mostram interessados pela instauração da Comissão estão usando de um tipo de ardil que de cara a esvazia ou a torna sem sentido. Ora, ora, ora! Se realmente é assim, somos forçados a concluir que sempre que algum político, em qualquer instância, acusa um determinado governo de sufocar CPIs, ou de atrapalhar seu andamento e coisas assim, está apenas fazendo um jogo de cena, pois, de acordo com o raciocínio de Pannunzio, a boa CPI é essa mesmo, qual seja, aquela que o governo de plantão ou outros de seus investigados tentam passar por cima com o rolo compressor.

Obrigado, nobres parlamentares Demóstenes Torres e Antônio Carlos Pannunzio! Nunca mais encararemos as CPIs com tanta ingenuidade!

A “outra” oposição, a representada pelos meios de comunicação, também tem se mostrado perdida com o caso dos cartões.

A velha e boa imprensa tem tentado vender a idéia de que a sua operosidade é que levou o caso a obter uma importante repercussão, a ponto de derrubar ministro, fazer que outro devolva dinheiro, que um terceiro tenha que se justificar. Mas, em verdade, todos sabem que o caso só está tendo tamanha amplitude graças à transparência do Governo Federal, que tornou os dados referentes aos gastos de seus servidores e agentes disponíveis a toda população, através do site da CGU. Aliás, deve-se acrescentar que, fosse a nossa mídia realmente diligente, os gastos da ex-ministra Matilde Ribeiro, por exemplo, não teriam chegado a um terço do que foi apresentado, pois algum jornalista inteligente (ou algum estagiário muito esperto) já teria verificado algo de estranho nas operações feitas com o cartão dela e denunciado ainda em tempo de estancar a sangria de mais de 170 mil. Admita-se, porém, que toda a sociedade poderia já ter criado o hábito de acompanhar esses gastos mais cedo e, conseqüentemente, ter exercido algum tipo de pressão sobre o governo.

A imprensa (metida a partido político, na opinião tanto de um estudioso do nível de Wanderley Guilherme dos Santos quanto do prefeito do Rio, César Maia) também parece pega de surpresa com a decisão governista de pedir uma CPI. Mas o que parece tê-la deixado realmente numa situação complicada foram os gastos com cartões semelhantes ao do Governo Federal perpetrados pelo Governo do Estado de São Paulo. A Folha somente deu destaque ao assunto após ser pressionada publicamente por Paulo Henrique Amorim (que apelidou a imprensa de PIG – Partido da Imprensa Golpista!), sendo obrigada a admitir, ainda que timidamente, que o sistema federal é mais transparente. Todavia, conforme notou o blog de Eduardo Guimarães, o jornalão, simpaticíssimo ao governo tucano de São Paulo, resolveu fazer valer o seu manual e deu um importante espaço ao “outro lado”, prática que também deveria observar quando difundisse denúncias e críticas ao Governo Federal.

As “oposições” fariam muito bem nessa altura do campeonato se não permitissem retrocessos na transparência dos gastos públicos. Não apenas precisariam impedir que o Governo Federal dificultasse o acesso a seus gastos ou ressuscitasse formas de despesa de difícil rastreamento, como deveriam obrigar as outras instâncias governamentais a que agissem com a mesma transparência. O primeiro passo poderia ser cobrar isso do Governo do Estado de São Paulo, tanto pela sua importância meramente simbólica quanto, mais prosaicamente, pelo volume nada módico de suas despesas.

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