sábado, 12 de julho de 2008

O pão nosso de cada dia

Na terça-feira 8 de julho, o Jornal da Tarde trouxe matéria sobre o preço do pãozinho na cidade de São Paulo. Dizia a manchete do jornal que as medidas de desoneração fiscal promovidas pelo governo para beneficiar o setor de panificação não propiciaram a redução de preços do produto, que, ao contrário, chegaram a subir em algumas padarias pesquisadas pelo diário.

Não é de surpreender. Essa conversa, não raro alardeada pela imprensa, de que a redução de impostos beneficia o consumidor final não passa de uma grande balela. Essa história do pãozinho faz parte da sessão “já vi esse filme antes”. Só para ilustrar, peguemos o notório caso da CPMF: a julgar pelo que dizia o patronato da FIESP e os seus estafetas na mídia, era de se esperar que, após a extinção do tributo, não estivéssemos sofrendo com a ligeira tendência de alta de preços que ora se verifica. Aliás, voltando um pouco no tempo, quando Adib Jatene exortou o ex-presidente Fernando Henrique a criar a contribuição do cheque para financiar a saúde pública, os empresários correram a ameaçar com repasse dos custos para o consumidor; o cardiologista inteligentemente os lembrou de que não haviam reduzido os preços por conta do fim do velho IPMF!

Seria desejável que, tendo em vista a oportuna reportagem do JT, alguns órgãos de imprensa fizessem um mea culpa, especialmente o Estadão, do mesmo grupo que edita o Jornal da Tarde. Que tal um editorial reconhecendo que o empresário brasileiro não tem jeito, que não adianta querer ter um discurso liberal, que o capitalismo “made in Brazil” tem muitas dificuldades de não ser selvagem, que os impostos não são o grande vilão que eles alardeiam?

Mas isso dificilmente ocorreria, caro leitor. O problema é ideológico. Os jornais fazem, como sugere Marx, aquele papel de justificação e mascaramento das relações reais. É como se fosse uma questão de princípios: para os grandes meios de comunicação, porta-vozes da classe dominante, imposto será sempre uma coisa muito ruim e ponto final. E quando os operosos empresários são obrigados a pagá-los aos montes, a carga, dizem eles, tem que forçosamente ser repassada para o pobre do consumidor. Portanto, por esse raciocínio, para que o elo mais fraco da cadeia não tenha que arcar com tudo, é fundamental que os governos incompetentes desonerem os empreendedores, para que o preço final se reduza; afinal, a culpa dos preços altos não é de empresários sedentos de lucro, como o são, por exemplo, os donos de jornais, mas dos políticos fanfarrões que só sabem cobrar impostos! Bem... a teoria é sempre “bonitinha”, mas, como diria Garrincha, é fundamental combinar com o adversário, ou melhor, no nosso caso aqui, com os donos das padarias!

Mas como o preço do pão “dói no bolso” da maioria esmagadora das pessoas, e como numa situação dessas as pessoas tendem a se sentir lesadas, é de se pressupor que elas talvez venham a encaminhar (ou já estejam encaminhando) mensagens ao jornal do grupo Estado reclamando da sordidez dos panificadores paulistanos. Em ocorrendo isso, nada restará senão lamentar a hipocrisia dos membros da classe média, aqueles que normalmente mais esbravejam contra os impostos e que são também os principais leitores daquele jornal. No fundo eles sabem muito bem que é assim que funciona, e, conforme já dissemos, este não é o primeiro caso. E o mais grave é que, da próxima vez que o Estadão, ou o próprio JT, ou uma Miriam Leitão sair por aí maldizendo a carga tributária e, pior, cantando loas à desoneração fiscal, o nosso revoltado ente da classe média falará “é isso mesmo”, e mais, sairá repetindo tudo ipsis literis para os colegas nos locais de trabalho, nos fóruns da Internet e nas ainda assim chamadas “seções de cartas” dos jornais. E os empresários, a classe dominante, sonegadores, todos em uníssono agradecem!

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