sábado, 27 de setembro de 2008

Eleições Municipais 2008 - São Paulo - Última leitura antes do provável segundo turno

O PSDB governa o Estado de São Paulo há mais de 20 anos, sempre com boa aceitação na capital; Geraldo Alckmin fez-se presente desde o início desse ciclo, primeiramente como vice de Covas, depois o sucedendo na vaga deixada pelo falecimento do titular, elegendo-se por via direta posteriormente e preparando o terreno para o sucessor pelo seu partido; o tucano teve uma gestão bem avaliada e foi, ainda, o candidato à sucessão presidencial preferido pelos paulistanos em 2006. Tudo isso parecia sugerir uma melhor sorte para o ex-governador na corrida pela prefeitura da Cidade de São Paulo.

Havia a favor de Alckmin, ainda, a resistência, por parte de alguns setores, ao nome da ex-prefeita Marta Suplicy e à administração tida como medíocre (na verdadeira acepção da palavra) do prefeito Gilberto Kassab. O candidato do PSDB, diferentemente de ambos, parecia contar com bom trânsito nos diversos estratos do município e ostentava, conforme já dissemos, a imagem de bom administrador.

Todas as pesquisas, porém, apontam um cenário em que a petista aparece com boa dianteira e que o postulante à reeleição emerge como bem mais do que um ator coadjuvante. Alckmin deve ter sido pego de surpresa. Talvez a mesma surpresa do autor destas maldigitadas. Se ele vislumbrasse essa possibilidade, certamente não teria brigado para ser candidato pelo PSDB, antes acataria a orientação, defendida - ainda que timidamente - por alguns líderes de seu partido, de apoiar a reeleição de Kassab.

Com o horário político e com a campanha nas ruas, Marta pôde mostrar algumas de suas realizações no município e apresentar propostas que parecem dar continuidade ao trabalho anteriormente feito. Kassab, por sua vez, conseguiu melhorar a sua imagem, agindo como alguém que está tendo a chance de dar publicidade a obras de sua administração que não apareciam na mídia. Já Geraldo Alckmin talvez tenha ficado com a pecha de alguém que não fez muita coisa pelo município e que, depois de ter sido governador e de ter sido derrotado à sucessão presidencial, quer a prefeitura como um tapa-buraco ou como um prêmio de consolação.

Caso se confirme, a derrota política do ex-governador seria de grande monta. Sem dúvida que ele ficaria com a imagem de grande desagregador. Lembremos que ele teve que brigar muito para ser candidato a presidente em 2006, quando muitos tucanos tinham a certeza de que José Serra seria um nome muito mais competitivo. E “batata”, Alckmin teve uma derrota humilhante no segundo turno, enquanto Serra ganhou fácil para governador ainda no primeiro turno. Agora em 2008, contrariando caciques e desagradando bases que estão engajadas desde a primeira hora na administração Kassab, o tucano insistiu em lançar candidatura própria, dividindo o partido e, ainda por cima, sem conseguir as facilidades que até seus antípodas achavam que ele teria.

Fiquemos por aqui, pois já erramos muitos prognósticos. Próximo comentário, somente depois do escrutínio de 5 de outubro.

domingo, 21 de setembro de 2008

Dias Mundiais sem Carro - a partir de 23 de setembro!

Dia 22 de setembro é o Dia Mundial sem Carro.

Em São Paulo, até mesmo o mais empedernido manifestante anticarro deve torcer para que os paulistanos não dêem muita pelota para a data. Isto porque o transporte coletivo, ruim todos os dias, costuma ser especialmente crítico às segundas-feiras, e alguns milhões de usuários a mais no primeiro dia útil da semana fariam do sistema um inferno pior do que ele já é. (Dizemos tudo isso, é claro, imaginando que em virtude do péssimo planejamento da cidade, muitos poucos poderiam se dar ao luxo de ir a seus compromissos a pé ou aventurar-se a eles ir de bicicleta).

Essa, aliás, é a grande desculpa que a maioria dos usuários do transporte individual usa para justificar a sua repulsa ao transporte coletivo: a sua notória precariedade. Mas, como já tivemos ocasião de dizer, em realidade, na cidade de São Paulo, a preferência pelos carros não decorre da má qualidade do sistema coletivo. Antes o transporte público é ruim por conta da predileção pela solução particular oferecida pelos automóveis.

Como reforço do que dizemos, noutras oportunidades lembramos que as pessoas usam o veículo particular nas situações em que até mesmo o transporte coletivo seria dispensável. Observa-se também que há, entre os usuários contumazes dos carros, moradores de regiões que não estão entre as mais mal servidas pelo sistema público de transporte, e que, portanto, não comportariam tal justificativa.

Desnecessário dizer que o automóvel particular está longe de constituir uma solução. Ele não é sucedâneo para o transporte coletivo, haja vista o tempo que se perde todos os dias no trânsito. Seus apologetas diriam, porém, que, se é para passar algum estresse, então que seja dentro da “bolha de lata”! (Com tal pensamento, o sistema público de transportes nunca será prioridade e um redesenho urbano que permitiria deslocamentos a pé ou por meio de bicicletas é algo impensável.) Acerca desse egoísmo dos motoristas, o filósofo André Gorz diz tratar-se de “um comportamento universal burguês”, decorrente da massificação do automóvel.

No mesmo texto, “A ideologia social do automóvel” (1973), publicado no Brasil pela Editora Conrad na coletânea “Apocalipse Motorizado”, Gorz cita um seu amigo da então Alemanha oriental que, ao contemplar o tráfego parisiense, disse desoladamente: “nunca se construirá o socialismo com esse tipo de gente”. Ninguém aqui, é claro, pensa em socialismo. Mas a mudança para um trânsito mais humano e com prioridade para o coletivo teria que nascer da mudança de comportamento das pessoas em relação ao transporte individual. Quando a solução para o caos em que nos encontramos for verdadeiramente enxergada como inserida na melhoria do sistema coletivo ou no uso de modelos alternativos, a pressão social obrigará o poder público a fazer a sua parte, seja com investimentos no sistema, seja com replanejamentos, seja com construções de ciclovias, e os operosos concessionários donos de empresas de ônibus não hesitarão em investir em melhorias. Estou sendo ingênuo? Bem... Alguém tem que acreditar no capitalismo neste país!

Minha proposta é que, em vez do Dia Mundial sem Carro, que se comece na terça-feira dia 23 uma campanha mundial pelo uso racional do carro, campanha esta que seja construída aos poucos. Em São Paulo, com um movimento desse tipo, o novo prefeito poderia sentir que as pessoas estão mudando sua atitude em relação ao transporte, e desse modo trabalharia a questão de forma diferente. Caso contrário, como político não é bobo, ele continuará preferindo a demagogia de fomentar o egoísmo dos irritados com o transporte coletivo. Em vez do “comam brioches”, ele continuará dizendo “que comprem carros”. Mas aqui nenhuma revolução será feita. Já a venda de automóveis corre o risco de continuar batendo recordes!

sábado, 20 de setembro de 2008

Capitalismo e liberdade?


Enorme coincidência: nesta semana, de grandes turbulências no(s) mercado(s), já estava programada, em curso de pós-graduação da setuagenária Escola de Sociologia e Política de São Paulo, aula baseada no clássico "Capitalismo e liberdade", de Milton Friedman, uma bíblia do neoliberalismo.

Uma colega de sala fez uma pergunta inevitável: o que Friedman pensaria das operações de socorro governamental aos bancos quebrados nos Estados Unidos? Um outro, com boa dose de sarcasmo, sentenciou que, enquanto tinham lucros, os bancos queriam distância das intromissões do Estado; já sob a crise, o intervencionismo estatal é bem-vindo, com direito ao obsequioso silêncio de todos que sempre professaram a cartilha neoliberal. Para nós brasileiros não há muita novidade: é a versão gringa do velho clichê representado pela idéia “lucros privados, prejuízos socializados”.

É uma temeridade palpitar acerca de qual seria a opinião do grande economista americano, mas é muito provável que ele apontaria erros na condução da economia, problemas de parte do governo e falhas dos empreendedores como forma de dar uma explicação racional para o problema. Mas, do ponto de vista moral, é certo que, pelo menos do que se depreende da leitura do livro citado, Friedman condenaria o “paternalismo” estatal que ora se verifica nos Estados Unidos da América. Está no final da introdução de "Capitalismo e liberdade", a crítica à atuação dos liberais do século XX, que, “em nome do bem-estar e da igualdade, acabou por favorecer o renascimento das mesmas políticas de intervenção estatal e paternalismo contra as quais tinha lutado o liberalismo clássico”. Portanto, se é que a crise não faria do famoso membro da Escola de Chicago um revisionista, ele passaria um sermão no seu amigo Bush.

Um famoso professor da Filosofia da USP, também comentarista econômico, aconselhou-me a evitar falar sobre economia, pois tal disciplina não é para diletantes. Ele deve ter razão. Aguardemos os próximos desdobramentos e deixemos o assunto de lado, por enquanto. Mas o registro da oportuna discussão da obra de Friedman na semana que finda pareceu-me de grande interesse, uma curiosidade talvez.

domingo, 14 de setembro de 2008

Eleições Municipais - São Paulo - Marta, Kassab e Alckmin

As pesquisas de intenção de voto para a Prefeitura de São Paulo divulgadas nesta semana devem reforçar certos modelos de atuação dos principais candidatos, modelos estes que se esboçaram no debate promovido pela Rede Bandeirantes na última quinta-feira.

Marta Suplicy, que já tinha muito que se ocupar com Geraldo Alckmin, agora não pode descuidar do ascendente Gilberto Kassab. Do mesmo modo, Alckmin, que imaginava que polarizaria com Marta e que deveria preservar Kassab, potencial aliado num eventual segundo turno, precisa agora voltar as cargas também contra o atual prefeito. Já o candidato à reeleição, por seu turno, talvez não tenha tanto que alterar sua estratégia inicial, haja vista que desde o começo já precisava voltar artilharia contra a candidata do PT e brigar pela posição de “anti-Marta” com o candidato tucano.

Depreende-se disso tudo que o prefeito herda, nesta altura do campeonato, a posição mais confortável na campanha: Marta e Alckmin entraram na disputa acreditando que teriam, cada um, um único adversário; Kassab, por sua vez, sempre soube que precisaria brigar com os dois. Portanto, enquanto a petista e o tucano ganharam um adversário de peso a mais, o que requererá mudanças de atuação, o democrata prosseguirá tentando manter a segunda posição contra Alckmin, ao mesmo tempo em que deve continuar mirando a ex-prefeita, com vistas a não deixar que ela dispare, ou seja, Kassab pode prosseguir, no geral, os princípios de sua campanha.

Numa próxima oportunidade, tentaremos discutir por que Alckmin, ex-governador bem avaliado, político de projeção nacional, candidato à Presidência da República bem-sucedido na capital paulista, não apenas fica muito atrás em relação a Marta Suplicy, como ainda se deixa ultrapassar por Gilberto Kassab. O que explica?

sábado, 13 de setembro de 2008

Lula e Evo, Brasil e Bolívia

Segundo o Datafolha, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva quebra o próprio recorde de popularidade. A grande novidade da mais recente pesquisa é que a sua aprovação agora também é maioria entre os mais ricos e escolarizados e entre os moradores das regiões Sul e Sudeste, estratos nos quais o presidente ainda encontrava alguma dificuldade de aceitação.

A explicação, como qualquer assessor de Clinton se apressaria em dizer, é o bom momento da economia. Ah, não se esqueça de acrescentar o “estúpido”!

Sem dúvida que o presidente Lula está numa situação indescritivelmente mais confortável do que, por exemplo, a de seu colega Evo Morales, presidente da Bolívia, que vem enfrentando turbulências oposicionistas que não pretendem outra coisa senão o golpe de estado. Entretanto, o que ocorre no país vizinho não seria, infelizmente, algo impensável de acontecer também no Brasil.

Não há acreditar que a chamada elite brasileira seja melhor do que a boliviana: basta pensar que somente agora, após praticamente seis anos de governo, o presidente Lula consegue parte do reconhecimento que já tinha de há muito nos segmentos mais populares; antes disso, só se viam choradeiras sem sentido e torcida indisfarçada pelas crises ampliadas pela mídia. E não é descartado que, na eventualidade de maus bocados na economia brasileira, viessem à tona com maior severidade os preconceitos de classe, raça, origem ou condição social, ou seja, os mesmos que hoje pressionam o presidente boliviano.

Numa crise muito acentuada, sob o governo de um presidente nordestino, haveria no Brasil grande possibilidade de os políticos dos estados do Sul e do Sudeste questionar o pacto federativo. Não há dúvida que tal tipo de discurso ganharia corpo entre a população: “São Paulo, por exemplo, é responsável por ‘não-sei-lá-quanto’ da carga tributária, mas somente uma mísera parte retorna para o Estado...”. E aí a “bolivização” do Brasil estaria feita.

Mas felizmente a nossa economia vai relativamente bem, e ninguém esquentaria a cabeça, pelo menos por enquanto, com possíveis distorções advindas do fato de sermos uma República Federativa. Nossa integridade territorial, portanto, está assegurada, e arroubos separatistas continuam nos parecendo coisas distantes, exóticas dir-se-ia até – ainda que se ouça alguma menção aqui, outra acolá, do tipo "se São Paulo fosse um país, seria uma potência do nível de...".

A aprovação ao governo Lula, de mais de 90% se considerarmos os que o julgam regular, é um elemento a mais de estabilização democrática. Mas isso não é tudo. A segurança institucional ampara-se também – ou sobretudo - na economia que insiste em crescer, apesar do COPOM. Afinal, aprovação por aprovação, o presidente Morales também tem, haja vista sua importante vitória obtida no referendo revocatório de algumas semanas atrás. A questão econômica, portanto, talvez sirva de desculpa para a violência perpetrada pela oposição no país andino.

sábado, 6 de setembro de 2008

Eleições Municipais 2008 - São Paulo - Vereadores

É praticamente impossível caminhar pelo centro de São Paulo sem ser abordado por algum cabo eleitoral de candidatos a vereador. Vez ou outra, pego algum folheto. De três postulantes, já li que recebem o apoio do Presidente Lula. Há sempre uma declaração atribuída ao Presidente da República dando a entender que ele, se pudesse, sufragaria o “dono do folheto”. Ainda bem que Lula não vota em São Paulo, caso contrário ficaria com o coração dividido na hora de teclar os cinco dígitos na urna eletrônica! Em todo caso, a sorte do Presidente não deve ser melhor em São Bernardo, onde ele provavelmente aparece como grande apoiador de inúmeros candidatos à vereança.

Mas há uma forma simples de se resolver isso, pelo menos quando todos os candidatos queridos estão no mesmo barco: é o voto na legenda. Assim, agrada-se a todos e não deixa ninguém chateado. E de qualquer forma, em última análise, todo voto vai para o partido num primeiro momento, mesmo quando confiado a um candidato em particular.

O legal da democracia é que cada um faz o que quer com o voto. Mas algo que constituiria um grande avanço para a vida institucional seria o hábito de se sufragar candidatos às Casas Legislativas pela mesma coligação dos eventuais candidatos a governante. Nem sempre o eleitor age assim. Em nível municipal, não raro opta-se por um pleiteante a alcaide do partido X e vota-se num postulante a edil da agremiação Y. O resultado, repisemos, são prefeitos sem maioria, tendo que “negociar” com uma Câmara cheia de gente sem compromissos com o eleito – sem compromissos sequer com uma eventual oposição séria ao prefeito. Daí o fisiologismo, a corrupção, os acertos.

O voto para vereador é muito importante. Entretanto, os heróis que assistem ao horário eleitoral gratuito sempre comentam acerca das “figuras” curiosas, dos artistas, dos “folclóricos”. Está na hora de se dar mais atenção a este aspecto de escrutínio tão importante para a vida das pessoas, até porque, como gostam de dizer alguns políticos, “o cidadão não mora no país, nem no Estado, mas sim no ‘município’”. Em suma, vamos “no popular”, vereador é – ou deveria ser - coisa séria!

E agora, como ficam os grampos?

É de nos encher de orgulho o conteúdo do belíssimo diálogo entre o senador Demóstenes Torres e o Presidente do STF, Gilmar Mendes, supostamente captado por escutas telefônicas ilegais. Coisa mais linda! Sem palavrões, nada de informações constrangedoras, nada de confissões perigosas. Os dois apenas falaram de preocupações sobre o andamento de CPIs e da ordem jurídico-institucional do país. Que maravilha!

Onde estão os calorosos elogios a esses dois grandes brasileiros? Puxa vida, pela primeira vez na nossa história o conteúdo de uma escuta telefônica, não importa se legal ou ilegal, vem a público sem constranger pelo menos um dos interlocutores, e mesmo assim não saímos por aí cantando loas e compondo poemas épicos para falar da honradez de ambos! E a indignação tem mesmo que ser muito grande com o expediente do grampo. Afinal, um Senador da República e o Ministro-Presidente do Supremo são ilegalmente grampeados, quando apenas queriam discutir questões nobres, que deveriam ser do interesse de toda a sociedade. Que injustiça.

Depois de uma dessas, fica mesmo difícil haver clima para tal tipo de serviço, ainda que ele seja necessário e feito de forma legal. Por isso, a coisa deve se complicar para quem for realizar certas investigações. O Governo Federal sentiu-se acuado e “mordeu a isca”, e mudanças vêm por aí.

Deve haver gente comemorando...

Caruso

Para mim, que não costumo dar muita “pelota” para as novidades do cinema, foi uma gratíssima surpresa o filme Match Point, dirigido por Woody Allen. O diretor encarna um Hitchcock numa história que tem ecos “dostoievskianos”, com direito à fortuna maquiavélica agindo na vida da personagem principal. Além de tudo isso, um outro destaque da película é a sua magnífica trilha.

Ao ouvir a beleza atemporal do canto que servia de fundo às belas imagens captadas por Allen, arrisquei o palpite de que se tratava de Enrico Caruso. E como sempre faço, acompanhei atentamente os créditos no final do filme. Foi confirmado! Era mesmo o genial tenor italiano.

Na noite em que assisti a Match Point decidi que iria comprar algum disco daquele que é um dos maiores cantores do século XX. E de fato peguei uma coletânea de gravações da primeira década dos novecentos, mais precisamente dos anos de 1906 e 1907. Mas cuidado: como uma espécie de efeito colateral da audição das gravações deste álbum pode-se acabar por ter menos apreço e interesse pelos Pavarotti, Bocelli, Carreras e outros. Passe “batido” por eles; vá direto em Caruso, que é infinitamente melhor. Palavra de leigo!