sexta-feira, 27 de março de 2009

Marolinha sem aspas

Alguns colunistas da mídia adotaram a expressão marolinha, utilizada pelo presidente Lula para se referir ao tamanho com que a crise econômico-financeira internacional iria atingir o Brasil. O vocábulo tem sido geralmente destacado entre aspas. O uso desses sinais não parece estar sendo com o intuito de indicar que se trata de uma metáfora, ou de gíria ou algo que o valha; em verdade, o que se quer é sugerir que o presidente pode ter dado uma bola fora, ainda mais que a imprensa tem sido bastante competente no tentar demonstrar que a crise teria desembarcado no Brasil em níveis que mereceriam ser associados a fenômenos naturais bem mais devastadores. Noutras palavras, as aspas que envolvem a marolinha presidencial, quando utilizadas pelos estafetas da imprensa, estão carregadas de ironia e sarcasmo.

Lula sabia que a crise atingiria o Brasil em alguma medida, tanto que admitiu que seríamos tocados por ela na forma da tal marolinha, o que significa dizer que ele não se iludia com o fato de que ela não chegaria de nenhuma maneira aqui, como tentaram distorcer alguns. O presidente, em verdade, buscou apenas demonstrar que não haveria tsunami (metáfora antípoda à do presidente brasileiro) na economia brasileira e por isso escolheu um termo que, na opinião dele, melhor dimensionaria os efeitos da crise neste país tropical. Que se analisem friamente os dados após cerca de dois anos de maus resultados em nível global e forçoso será concluir que, com efeito, no Brasil a crise é só a tal marolinha mesmo.

A bem da verdade, não foi apenas o presidente da República que se mostrou por assim dizer otimista com os possíveis efeitos da crise no país. Órgãos como a OCDE e o FMI já haviam, antes dele, afirmado que o Brasil era das nações menos vulneráveis aos maus bocados internacionais e que, ipso facto, levaria poucos arranhões oriundos desse acidente universal. O ingrato Lula deveria ter dado os créditos!

A imagem da marolinha brasileira vem sofrendo a tentativa de desmoralização promovida pela mídia calcada principalmente em dois resultados bastante significativos: a queda do PIB no quarto trimestre de 2008 e os fechamentos de vagas no mercado de trabalho nos meses de dezembro e janeiro últimos. Mas vamos lá: não obstante a contundência com que o mercado foi atingido em 2008, a grande verdade é que dezembro sempre foi um mês de expressiva dizimação de empregos, mesmo em anos de bonança internacional; já o PIB do último quartel do ano passado – nunca é exagerado lembrar – foi desastroso se comparado com o terceiro trimestre, mas positivo se confrontado com idêntico período de 2007 – fora o fato de que no acumulado do ano obteve excelente resultado, como já apontamos noutra postagem. Merece nota também a informação de que o mês de fevereiro foi positivo na criação de vagas do mercado formal de trabalho. A imprensa, como se sabe, quis minimizar o resultado que, realmente, é marcadamente inferior ao do mesmo mês de 2008; mas, num mundo em que se comemora quando o desemprego aumenta em nível menor do que o esperado, deveria ser celebrado o tímido porém consistente resultado do mercado de trabalho brasileiro no segundo mês de 2009.

Os jornais brasileiros fizeram, por motivo político, uma aposta na crise. Tentam de toda forma mostrar que acertaram. Já a rede norte-americana CNN parece pensar de maneira diversa: o mais famoso canal noticioso do mundo afirmou, quando do encontro dos presidentes Lula e Obama, que uma das grandes qualidades do Brasil neste momento é que o país tem sofrido muito menos com a crise quando comparado a outros países da mesma importância. Yes, nós temos marola!

Um amigo conta-me que propaganda do DEM – que não tive oportunidade de assistir – vem tentando explorar a metáfora molhada de Lula, procurando mostrar a suposta infelicidade da fala presidencial. O cerco se fecha: o partido de José Agripino Maia tem na grande imprensa o mentor intelectual de seu discurso. O assunto crise econômico-financeira internacional (a bola da vez) tem que ser martelado diuturnamente na mídia, para que partidos oposicionistas, claramente sem projeto, tenham do que falar e possam dar suas alfinetadas de vez em quando. É essa a importância da vetusta imprensa no Brasil de hoje!

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