domingo, 28 de junho de 2009

Responda rápido

O questionamento tem fama de dar origens às descobertas e às grandes formulações. A filosofia, por exemplo, desde os tempos dos pré-socráticos buscava respostas às inquietações. O próprio Sócrates usava o sistema de se fazer grande número de perguntas para se alcançar o entendimento de algo, ou ao menos concluir que, no fundo, nada sabia. O mesmo vale para a psicanálise e para diversos métodos científicos.

Estamos longe de, aqui, querer fazer ciência ou implementar investigações filosóficas. De todo modo, aceitamos a idéia de que um bom número de perguntas pode trazer alguma luz a inquietações em diversas áreas do interesse humano, e talvez, principalmente, para os assuntos mais mundanos e ordinários.

Gostaria de propor tal tipo de exercício: colocarei, a seguir, diversas perguntas espalhadas, girando sobre o mesmo tema, e o leitor, se assim o quiser, pode respondê-las mentalmente e, também somente se o quiser, tirar algumas conclusões. Comecemos:

José Sarney é um novato, ou é uma velha raposa da política?

Sarney sempre foi um tipo meio “coronelesco” de um Estado da Federação atrasado, ou ele só começou a significar algo ruim na política nos últimos meses?

A mídia sempre perseguiu Sarney, em virtude de ele ser um representante das oligarquias retrógradas do país, ou só começou a realmente fazê-lo nos últimos meses?

José Sarney por acaso não tem uma coluna no jornal Folha de São Paulo?

Por conta dos escândalos no Senado Federal, a Folha parou de publicar a supramencionada coluna, ou a continua publicando?

O presidente do Senado, José Sarney, é amigão do peito, ou é desafeto do governador José Serra?

Sarney faz oposição cerrada, ou é aliado de primeira hora do governo Lula?

Senadores como Heráclito Fortes e Efraim Moraes têm ligações com escândalos da Câmara Alta. Você vê ou ouve a mídia dar a mesma atenção às suspeitas que recaem sobre eles?

Os dois senadores do parágrafo anterior pertencem aos Democratas. O DEM é da base aliada, ou faz oposição ao governo Lula?

Termino aqui a bateria de perguntas. Tenho certeza que a maioria esmagadora dos brasileiros não encontraria dificuldades de responder a cada uma delas. Acredito, ainda, que se fosse feita uma enquete, a resposta ganhadora de cada uma das questões o seria de forma quase unânime. Não há, nos parece em princípio, possibilidade de imaginar que as questões acima são complexas ou que suscitariam polêmicas quanto a suas respostas. Elas são simples, diretas e parecem não abrir muito espaço para grandes discussões. São questões singelas que mereceriam respostas singelas, nada que seja digno de um Platão ou de um Freud!

Uma última – e mais difícil - pergunta: baseado nas respostas que deu acima, por que, em sua opinião, a mídia está agora – e somente agora – pegando tanto no pé de Sarney?

sábado, 27 de junho de 2009

Sky Saxon (1946-2009)

No mesmo dia do falecimento de Michael Jackson, 25-06-2009, eis que o mundo da música também perde o cantor e compositor Sky Saxon, expoente do rock psicodélico dos anos 1960, mais precisamente da corrente conhecida como psicodelia de garagem. Saxon, não obstante tenha cometido alguns trabalhos solo, será sempre lembrado como líder e vocalista do grupo The Seeds, um dos mais importantes do gênero.

Desnecessário dizer quão menor, do ponto de vista do reconhecimento popular, Saxon é em relação a Jackson. Mas o seu rock cru, áspero e direto (clichê pouco é bobagem) deixou marcas nas décadas que lhe sobrevieram: nos anos 1970, o punk e a new wave bebiam muito da fonte do rock de garagem sessentista; nos anos 1980, a influência é perceptível nos grupos independentes, sobretudo pelo trabalho de guitarras; nos anos 1990, o grunge e as guitar bands são tributários óbvios da virulência não apenas dos Seeds, mas de outras bandas fantásticas, como The Music Machine, The Blue Magoos, Shadows of Knight, Chocolate Watchband etc.

Assumo, neste momento, o compromisso de, no ano que vem, quando o mundo inteiro lembrar o primeiro ano sem Michael Jackson, prestar uma homenagem particular a Sky Saxon, ouvindo os Seeds com seu disco de estréia, o homônimo de 1966, ou o “freakaço” Future, de 1968, dois LPs de que muito me orgulho por ter em minha coleção. Ah, com um pequeno detalhe: por incrível que pareça, as bolachas são nacionais!

Abaixo, veremos dois vídeos, extraídos de programas da televisão estadunidense, com The Seeds interpretando seus dois maiores hits (localizados, esquecidos e singelos, mas hits!), ambos do primeiro disco, de 1966: “Pushin’ Too Hard” e “Can’t Seem To Make You Mine”. Grande Sky Saxon!



Michael Jackson (1958-2009)

Em belíssimo texto para a Village Voice, em 29 de agosto de 1977, o crítico Lester Bangs perguntava: onde você estava quando Elvis morreu? O que você estava fazendo? A idéia dele era estabelecer uma comparação com eventos como o ataque a Pearl Harbour e o assassinato de Kennedy. Com efeito, as pessoas tendem a tomar um choque com notícias de maior grandiloqüência a ponto de ficar na memória a situação em que a receberam. Lembro-me, por exemplo, de como fui informado dos ataques de 11 de setembro de 2001. A exemplo do maior atentado terrorista da História, a morte de Michael Jackson também foi evento que ganhou o mundo de forma up-to-date, estando o planeta varrido pela triste notícia em pouquíssimos minutos. E a forma como a recebi parece-me simbólica de nossa era – Lester Bangs talvez gostaria de saber!

Como já deve ter dado para perceber, soube da morte do artista pela internet. Estava navegando pelo site RateYourMusic e resolvi dar uma passada pela sua comunidade em português, quando tomei um susto ao ver um tópico de discussões intitulado “RIP Michael Jackson”. Não estava sabendo de nada e entrei no tópico, que não contava, ainda, com nenhuma mensagem. Na hora me passou pela cabeça que pudesse ser uma brincadeira; por não haver nenhuma notícia ou comentário ilustrando a chamada, cogitei também que poderia ser um engano. Acessei algum sítio noticioso, e lá estava, em letras garrafais, gritando, que Michael Joseph Jackson morre aos 50 anos em Los Angeles.

Michael nasceu em 1958, portanto depois do estouro do nosso já citado Elvis, depois de a TV já se encontrar na maioria dos lares norte-americanos, depois de as gravadoras já saberem que a imagem poderia ajudar a vender música e exatamente numa época em que se começava a sacar a possibilidade de empurrar sucessos goela abaixo dos ouvintes. Como disse Adorno, “em vez do valor da própria coisa, o critério de julgamento é o fato de a canção de sucesso ser reconhecida de todos; gostar de um disco de sucesso é quase exatamente o mesmo que reconhecê-lo.” (O fetichismo na música e a regressão da audição, coleção Os Pensadores, São Paulo: Abril Cultural, 1975). E olha que o filósofo alemão, "pop star" (heresiazinha!) da Escola de Frankfurt, dizia isso do jazz! O que não falar da música verdadeiramente pop, qual seja, aquela bem banal, pegajosa e "sem caráter" cometida a partir da segunda metade do século XX?

Nossos leitores mais fiéis (se é que eles existem!) sabem que, sempre que falece alguém importante do mundo cultural neste primeiro decênio do terceiro milênio, logo digo que é um pouco de século XX que está morrendo. Nunca tal ilustração foi tão verdadeira. Michael Jackson era, de fato, um cara dos “novecentos”. Ele era um artista para quem a divulgação representava muito, a imagem era tudo, esquisitices e escândalos eram importantes... Ah, sim, um pouco de música poderia, eventualmente, cair bem! O Jackson Five e os Jacksons eram musicalmente legais; o álbum Off the Wall, de 1979, é respeitabilíssimo. Já o megaplatinado Thriller, de 1982, tem grande importância histórica, mas não o considero bacana de ouvir. Isso mesmo, Thriller, em minha humílima opinião, não tem lá tão boa música. Mas isso não importa tanto, como veremos.

Lembram-se de termos falado que Michael é um sujeito da era da imagem, da autopromoção, do “choque”? Pois bem, Thriller foi o disco certo na hora certa. A produção de Quincy Jones apostou na facilidade sonora, num álbum bem mais pasteurizado do que o anterior, o supracitado Off the Wall, o que não impediu, todavia, a presença de canções respeitáveis como “Billie Jean” e “Wanna Be Startin’ Somethin’”. Mas o que fez a diferença foram as imagens. Se o autor destas maldigitadas não se engana, ao menos no Brasil, a canção “Beat It” e, principalmente, a faixa-título estouraram primeiramente como videoclipes para depois ganhar as ondas do rádio. É paradoxal que o “disco sonoro” mais vendido da história tenha dependido tanto daquilo que se gostava de “ver” à época. Isso é de importância histórica inequívoca. Acabou virando moda: depois disso, a MTV passaria a ditar uma boa dose dos sucessos, que ganhariam reconhecimento somente após serem vistos na tela. Bem, se a alguém interessa saber, este blogueiro considera os clipes extraídos de Thriller tremendas bobagens; preferimos “ouvir” canções como “I Can't Help It”, do álbum de 1979, que sobrevive somente de sua beleza musical, sem necessidade de imagens.

Depois de todo o estouro, não valia mais a pena se interessar pelo trabalho de Michael, tampouco por sua vida pessoal, seus dramas, bizarrices e tudo mais.

O pop, em toda a sua banalidade e “descartabilidade”, perdeu o seu, por assim dizer, resumo. O pop nem sempre é bom; o pop nem sempre nos enche de orgulho se nos entusiasmamos por ele; o pop, em verdade, chega às vezes a nos corar de vergonha ao admitir que dele gostamos. O pop era Michael Jackson mesmo.

Abaixo, The Jacksons (e não Jackson Five, como erroneamente aparece), com "Blame It On the Boogie", de 1978, um trabalho de transição do Michael Jackson criança para o artista... "um pouco menos criança" que se tornaria.

sábado, 20 de junho de 2009

Imprensa comum

Nesta semana, o presidente Lula saiu em defesa do enrascado José Sarney. Falou da história do presidente do Senado, sugerindo que ele mereceria mais respeito por não ser uma “pessoa comum”.

A imprensa, de maneira geral, não gosta das coisas que Lula fala. Imagine, então, quando seu discurso alfineta o liberalismo de mentirinha de que a mídia é a porta-voz.

A grita foi geral: “como assim não é pessoa comum?”; “todos são iguais perante a lei”; “Para Lula, alguns são mais comuns do que outros”. O jornalista Clóvis Rossi asseverou que a fala do presidente brasileiro era uma versão do “você sabe com quem está falando?”.

Ora, Sarney não deve ser mesmo uma pessoa comum. Tanto que ocupa, às sextas-feiras, bem ao lado do simpático Clóvis Rossi, uma nobre coluna na página 2 da Folha de São Paulo. O jornalão paulistano não costuma ceder tal espaço para gente muito ordinária: ocupam-no ou já o ocuparam pessoas como Delfim Netto, Emílio Odebrecht, José Serra, Florestan Fernandes, Marcos Nobre, Marina Silva, Kenneth Maxwell e outras menos comuns do que aquelas que têm suas missivas devidamente editadas na página seguinte, numa menos nobre sessão conhecida como “Painel do leitor”!

Por falar em Folha, e de resto toda a imprensa, seria interessante que se colocasse em prática esse reconhecimento da igualdade entre os cidadãos. Um bom começo seria aceitar numa boa que possíveis prejudicados buscassem socorro no Judiciário, sem serem acusados de estar atacando a liberdade de imprensa ou - sacrilégio! - a liberdade de expressão. Noutras palavras, se, por exemplo, seguidores da Igreja Universal se sentissem ofendidos por matérias de jornais, poderiam, sem ser agredidos com editoriais de primeira página, recorrer à Justiça. Afinal, donos de jornais também são pessoas comuns, e, por conseqüência, as empresas que lhes dão lucros não merecem qualquer status especial,o que quer dizer que podem ser processados como "qualquer um". Ou será que Lula tem razão, e na verdade esse papo de igualdade é conversa mole para boi dormir?

Lula não defendeu apenas Sarney. Em verdade, o presidente brasileiro intercedeu em favor do Senado Federal e, em última análise, do Congresso Nacional. O fato, negligenciado pela imprensa, mereceria melhor análise.

Passou pela cabeça de alguém a idéia de que o presidente poderia, em realidade, faturar com um Congresso combalido? Pensemos bem: sem dúvida que diversos governantes em todo o mundo sonhariam ter a popularidade extraordinária de Lula com um parlamento desacreditado. Seria difícil para muitos resistir à tentação de botar em prática a mão de ferro. Imaginemos um FHC, com a aceitação popular que tem o atual presidente, governando com um Congresso Nacional tão impopular: que sonhos estariam passando pela cabeça dele? E quais os conselhos que lhe estariam dando os donos de jornais?

Observe-se, também, que Lula, mais do que na Câmara, costuma passar por maus bocados nas votações do Senado. Ou seja, ele teria milhões de motivos para deixar a Câmara Alta chafurdar sem precisar arranhar o seu prestígio fazendo-lhe uma defesa que, a bem da verdade, não deixa de ser inútil. Pensando bem, Lula atuou como estadista: agiu em favor da harmonia dos poderes. Não é todo dia que o chefe do Executivo sai em defesa de outro Poder, ainda mais quando não se tem tanta certeza de que ele lhe é tão favoravelmente complementar.

E quem parece que melhor matou a charada mesmo foi o jornalista Paulo Henrique Amorim. Disse ele que a perseguição capitaneada pela mídia contra Sarney somente agora, depois de “quinhentos anos” de abusos e "ligações perigosas" do ex-presidente, deve ser em virtude de ele não dar moleza para José Serra, por conta da sabotagem cometida contra a pré-candidatura da filha para o pleito de 2002, e também pelo fato de cometer o supremo pecado de apoiar o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. De fato, é muito para o PiG!

Leia o divertidíssimo texto de PHA clicando aqui.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Irã: eu acho...

O bacana de se pilotar um blog é poder ficar dando pitacos sobre os mais diversos assuntos de forma mais ou menos impune. Além disso, pode-se dormir com a consciência tranqüila por não estar investido da autoridade dos especialistas. É só “achismo” mesmo e ponto final.

Os chamados cientistas políticos não deveriam gozar da mesma cuca fresca, pois se aproveitam de sua condição para fazer comentários e vaticínios deveras particulares sob a aura de uma suposta expertise. Ao agir desse modo, no mais das vezes com acentuado viés ideológico e deixando transparecer seus desejos e idiossincrasias, recusam, em verdade, a honestidade intelectual e a objetividade científica possível de que fala Max Weber na sua famosa conferência intitulada A ciência como vocação.

Vamos aqui, “acientificamente”, apenas revelar nossas impressões sobre o que ocorre no Irã. (Até porque não dá para ter muito mais do que isso: meras impressões).

Eu, “euzinho da silva”, acho que não houve fraude nas eleições do Irã. O presidente Mahmoud Ahmadinejad provavelmente ganhou mesmo. Volto a dizer, trata-se, obviamente, de mera opinião pessoal. Não posso afirmar que não tenha havido fraude. Ninguém pode. Mas ninguém – repito, ninguém - pode também afirmar peremptoriamente que houve. Certo está o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que atribuiu as comoções naquele país a uma provável choradeira dos derrotados. Errados estão os colunistas da grande imprensa, como Merval Pereira e Dora Kramer, que tentam desautorizar o presidente brasileiro por ele estar apoiando o seu colega iraniano reeleito. (Em realidade, Lula não está necessariamente dando apoio a Ahmadinejad; apenas faz aquilo que seria de se esperar de qualquer pessoa de bom senso: reconhecer os resultados das urnas de um país soberano; e se for o caso de haver alguma coisa errada por lá, o melhor a fazer é aguardar com cautela antes de sair atirando pedras).

Pelo que se depreende das notícias que chegam do país islâmico, as manifestações estão restritas aos grandes centros urbanos, mais especificamente à capital Teerã. O grupo oposicionista é organizado e barulhento, e o seu reclamo é ecoado pela mídia ocidental, que desde o início demonstra pouco entusiasmo com o presidente iraniano. Sabe-se que há, por outro lado, manifestações favoráveis ao presidente reeleito; mas elas não parecem contar com a mesma simpatia por parte da imprensa do ocidente.

E se o assunto é achismo puro e simples, vou externar uma opinião meio amalucada: eu, “euzinho da silva”, acho que o Brasil não esteve muito longe de situação parecida. Em 2006, se o candidato Alckmin não tivesse decepcionado parcela de seus eleitores e, especialmente, parte da imprensa, sobretudo por não ter tido coragem de defender o legado privatista dele e de seu partido, não seria de descartar que se ameaçasse falar em fraude ou em abusos e coisas do gênero para tentar melar a acachapante vitória de Lula.

Imaginemos a cena: a classe média paulista sairia às ruas, concentrar-se-ia na Av. Paulista e com a ajuda da mídia convocaria outras manifestações em grandes centros urbanos do sul-sudeste; as imagens rodariam o planeta nas telas da CNN e parariam nas páginas de internacionais dos jornais estrangeiros. Ipso facto, estariam todos mundo afora papagaiando que o presidente "populista caudilho" do Brasil fraudara as eleições. Ademais, haveria um Marco Aurélio Mello para jogar gasolina na fogueira.

Viagem pura? Certamente que é. Estou a afirmá-lo desde o começo. Mas, sincera e modestamente, não acho que meu achismo seja mais irresponsável ou mais ridículo do que o dos outros.

domingo, 14 de junho de 2009

Essa é pra tocar no rádio!

A má qualidade da programação das rádios FM vem sendo amplamente reconhecida nos últimos tempos. Confirme-o por si mesmo falando sobre o assunto com as pessoas que lhe são próximas. A internet vem contribuindo para expor essa ferida. Qualquer um pode criar sua própria rádio na rede. Até mesmo o autor destas maldigitadas conta com uma no LastFM (Se algum masoquista quiser conferir, favor clicar aqui).

Mas as rádios convencionais às vezes surpreendem – e positivamente! Estava eu preparando-me para um sono recompensador num domingo à noite, quando liguei o rádio, meio que de bobeira. Na Eldorado FM estava rolando um programa na linha de flashback (Reserva Eldorado, se não me engano). Tal qual não foi minha surpresa, começo a ouvir os primeiros acordes de "Brother Louie", do semiobscuro Stories, do ano de 1973.

O grupo contava em sua formação com o já experiente Michael Brown, que passara pelo Left Banke e pelo Montage, na segunda metade dos anos 1960. As duas bandas foram expoentes do chamado baroque pop, tendo se notabilizado com canções leves e metidas a artísticas em trabalhos altamente recomendáveis, coisa de uns três ou quatro LPs e um belo punhado de singles. Já o Stories, por seu turno, "setentista" que era, bebia na fonte do que se convencionou chamar de power-pop: pop sim, mas com uma batida mais rock, de pegada forte.

A canção que vamos ouvir também foi lançada em compacto, no mesmo ano de 1973, pelo grupo inglês de funk e soul Hot Chocolate. Aqui, na versão dos Stories, temos um clássico do gênero que se convencionou chamar de blue-eyed soul, que é a soul music ou o funk negro interpretado por garotos brancos, constituindo um paradoxal misto de canastrice e paixão (se bem que talvez não tão paradoxal assim, pois canastrice e paixão tem tudo para andar juntas!).

Ouça agora, de 1973, Stories com "Brother Louie"

sábado, 13 de junho de 2009

Um blog incomoda muita gente!

O blog da Petrobras vem sendo vítima da fúria de colunistas e editores de jornais Brasil afora. A celeuma é emblemática da falta de norte do jornalismo, em especial o impresso, em face do poder e alcance da Internet. Irresistível é dizer logo de cara: bem-vindos ao século XXI, senhores jornalistas!

A idéia da Petrobras de criar um blog em que antecipa as declarações e os dados que repassa à imprensa vem sendo acusada de antiética e de prática típica de brucutus. Grande bobagem ou puro desespero daqueles que o dizem. A única preocupação deveria ser, em realidade, quanto à legalidade da medida. Em princípio, não parece haver problemas em relação a isso, pois a “empresa de economia mista” apenas reproduz as informações de que é dona por direito.

No que se refere à ética, é de se suspeitar que a petroleira, no fundo, tem bons motivos para não acreditar na imprensa. Aliás, se os propósitos midiáticos fossem indubitavelmente honestos, é de se supor que os órgãos não se sentiriam tão incomodados com a salutar e transparente medida da nossa mezzo estatal. Noutras palavras, é mais livremente presumível que a Petrobras, ela sim, é que, ao divulgar a íntegra do que lhe perguntam e do que ela responde, parece estar se protegendo de uma eventual falta de ética jornalística. Será que não?

A iniciativa da Petrobras também tem sido acusada de tentativa de intimidação. Como assim? Será que há motivos para os jornalistas se intimidarem? Ora, bem-intencionados que são, os profissionais de imprensa, comprometidos com a verdade e com a lisura de seu trabalho, nada certamente têm a temer do "terror" praticado pela “petrossauro”.

De resto é risível que a imprensa, tão dada a pedir transparência de todos, fique chocada com a abertura escancarada cometida pela Petrobras em seu blog.

A grande verdade é que a imprensa sofreu um golpe. Ela vinha recentemente prestando o nobre papel de criar manchetes para a oposição municiar a sua CPI da Petrobras, tida quase como um último recurso para enfraquecer o governo federal. Com o blog, torna-se difícil a velha e boa manipulação que todo mundo, no fundo, sabe que vigora nas práticas jornalísticas.

E por fim: juro que não me lembro; quantos jornalistas incontidos e quantos editoriais raivosos se insurgiram contra a PetroBrax, nos “bons tempos” de FHC? Se alguém souber, por favor, “cartas para a redação”!

quinta-feira, 11 de junho de 2009

"Recessão técnica"

Conforme previsto no post anterior, o PIB do primeiro trimestre de 2009 recuou em relação ao período anterior. Ainda que a queda tenha sido sensivelmente menor do que a esperada, os jornais não deixaram de ecoar a tal “recessão técnica”, que é definida por dois trimestres com resultados negativos em relação ao anterior.

Observe-se que a recessão lato sensu tem um significado bem mais, por assim dizer, assustador: “Conjuntura de declínio da atividade econômica, caracterizada por queda da produção, aumento do desemprego, diminuição da taxa de lucros e crescimento dos índices de falência e concordatas.” (Dicionário de economia, Org. e Sup. de Paulo Sandroni. São Paulo: Best Seller, 1989). Não é, com efeito, a real situação da economia brasileira, daí porque ter que se buscar a expressão “recessão técnica”, de definição mais objetiva, para se conseguir dar notícias em tom catastrofista.

E de nada adiantaram as advertências de que o PIB divulgado seria, nas palavras do ministro Guido Mantega, um olhar no retrovisor, afinal se referem a um trimestre encerrado há mais de dois meses. Também não foi dada a devida atenção para o fato de que o recuo trimestral representou um importante avanço em relação ao péssimo resultado do último período de 2008. Isso sem falar do descaso com os dados mais hodiernos da economia do país, os quais não se coadunam de nenhuma forma com os elementos que efetivamente fazem uma recessão, de acordo com a definição do dicionário de Sandroni. A Folha, por exemplo, não se fez de rogada e manchetou na quarta (10-06-2009): “Brasil está em recessão” - ainda que esquizofrenicamente tenha colado à manchete análise de economista dizendo que a coisa não estava feia para nós!

À exceção da Agência Brasil, não logrei ver em nenhum órgão a importante informação de que no acumulado de 12 meses o crescimento foi de 3,1% (leia aqui). Quer dizer, se, por hipótese, março tivesse sido o fim de um ano, o PIB brasileiro teria sido digno de consideração para tempos de crise. A Itália, por exemplo, certamente não teria a mesma sorte, haja vista que tem queda no seu produto interno bruto por quatro trimestres consecutivos. Os italianos, sim, sabem o que é recessão!

De todo modo, por incrível que pareça, o resultado trimestral da economia brasileira acabou sendo bom ao menos nos seus desdobramentos: a queda está longe de poder ser considerada catastrófica, mas permitiu que o Banco Central fizesse um corte até que profundo na SELIC. Não é improvável que se os números viessem positivos, como certamente virão no segundo trimestre, o COPOM tivesse uma das suas recaídas conservadoras.

Feliz recessão – técnica – para você também!

sábado, 6 de junho de 2009

"Delay" do resultado do PIB

Delfim Netto, na sua coluna da Folha na quarta-feira (03-06-2009), tratou da problemática da divulgação de resultados do PIB. Tal tema, não há muito, foi também abordado no blog do Stephen Kanitz. A questão é que os dados trimestrais sobre o PIB só saem quando já está findando o trimestre subseqüente, o que, dada a volatilidade dos períodos de marolinha, pode desenhar algum retrato irreal da economia.

Vejamos: até o terceiro trimestre de 2008 a economia brasileira vinha obtendo um crescimento bastante significativo; tal dado só veio à luz quando, na prática, a nossa economia já se desacelerava, em parte por causa da crise internacional e, principalmente, por conta do terrorismo da mídia, por isso, governo e parcela da sociedade comemoraram algo que no “mundo real” já não ocorria. Já o PIB do quarto trimestre, divulgado no início de março deste ano, levou um tombo para lá de considerável, resultado que foi ecoado pelos quatro cantos num momento em que a queda possivelmente já se mostrava acentuadamente desacelerada.

E, agora, as informações sobre o primeiro trimestre de 2009 devem ser divulgadas já neste mês, ou seja, praticamente no final do segundo trimestre. O triste é que deve trazer números negativos, ainda que melhores em comparação com os do último trimestre de 2008 do que estes confrontado com os do penúltimo. Dizemos que é triste especialmente porque o resultado abrirá caminho para os jornais se regozijarem com uma tal “recessão técnica” num momento em que a economia real, provavelmente, já esteja em situação positiva, pelo menos conforme sustentam alguns analistas, dentre os quais o nosso já citado Kanitz.

Talvez fosse o caso de o IBGE tentar computar os dados com mais rapidez, para divulgá-los ainda em cima da pinta, enquanto vigora o retrato que fotografou. Do jeito que está, visualizar o PIB é como se se estivesse olhando para trás, para uma realidade que já passou, não servindo para muita coisa (se bem que talvez não sirva para nada mesmo, de maneira geral).

Mas, com o perdão do leitor, vamos filosofar um pouquinho! Vivemos num mundo afogado em números, viciado em dados, soterrado por estatísticas que obscurecem as reflexões. Se o crescimento econômico está alto ou está baixo, por que só se tem coragem de afirmar isso quando os números oficiais são apresentados? Explico-me melhor: um número representa algo real, é a mera expressão desse algo, logo, esse "algo" deveria se apresentar por si só. As pessoas teriam que estar reclamando e apontando a deficiência do crescimento, se fosse o caso, antes de os números serem publicados, e deveriam continuar a fazê-lo mesmo que o número divulgado surpreendesse e batesse a inacreditável casa dos 10%, por exemplo. Afinal, o que vale é o mundo real, o que se "sente na pele", não o número que o expressa. Não é possível que um dado seja mais importante do que a realidade que supostamente representa; ou mais: não é possível que a mera divulgação do dado seja mais importante do que o dado em si!!! Será que fui claro?

Mas para que ser claro? Para que explicações? O que vale é a frieza do número, a ser informado no momento oportuno: três meses depois!

terça-feira, 2 de junho de 2009

Secretaria de Serra vai às compras

A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo vem dando o que falar. A pasta, atualmente comandada pelo Sr. Paulo Renato de Souza, ex- ministro da Educação do governo Fernando Henrique Cardoso, vem aparecendo nos meios de comunicação talvez mais do que gostaria . Poderia ser simplesmente pelo motivo de o estado mais rico da Federação, governado pelo tucanato há 15 anos, ter um dos piores ensinos do país, mas é pelo fato de os livros didáticos conterem erros grosseiros ou material impróprio para crianças.

Os “dois paraguais” presentes em mapa inserto em livro de geografia parece ter sido o que menos incomodou. Compreensível de alguma maneira. Na nossa atual condição de “potência regional”, talvez já não nos atentemos a um certo modo imperialista de agir. Colocar dois ou três paraguais num livro de geografia equivaleria – mal comparando - ao velho hábito estadunidense de afirmar que a capital do Brasil é Buenos Aires e ficar tudo por isso mesmo! Desse modo, é de somenos importância.

Já o dito conteúdo impróprio a crianças causou mais alvoroço. Foram quadrinhos com forte conotação sexual e uma poesia um tanto, digamos, marginal. As obras - todos parecem ser unânimes nisso - definitivamente não servem ao público pré-adolescente.

Mas vamos lá, amigo leitor! E quanto aos games superviolentos cultuados por garotos que mal sabem ler e escrever? E a programação da TV com cenas de violência e temas picantes a qualquer horário?

A propósito, acerca da televisão, foi por demais interessante o bombardeio que sofreu a proposta de classificação indicativa que o Ministério da Justiça tentou emplacar. Os mesmos órgãos de comunicação que agora se mostram tão surpresos com as barbeiragens do governo Serra, quando da discussão do projeto que pretendia disciplinar os horários da programação de TV, colocaram em campo a tropa-de-choque de colunistas histriônicos, sempre prontos a denunciar a censura, o bolchevismo, o dirigismo etc. etc. etc.

Alguns podem dizer que é diferente, afinal a televisão não tem a mesma responsabilidade da escola, ou de um livro didático ou, ainda, de um ente governamental. Será que não mesmo? A complexidade da nossa sociedade parece não deixar dúvidas de que se aumentou o leque de responsabilidades para a difícil tarefa de educar. Não dá para simplesmente abandonar a garotada, fazer pouco caso da programação de TV, ser liberal com games violentos, aceitar na boa que se circule à vontade por sites de relacionamento mesmo sabendo que por lá pode haver racismo ou homofobia etc., e achar que a escola - ou seus livros didáticos - pode cobrir qualquer lacuna. Isso, aliás, assemelha-se ao velho erro de achar que a figura do professor pode substituir a dos pais: "ah, deixa meu filhinho; depois o professor conserta; afinal, é trabalho dele!". E não se trata de defender o controle pelo controle ou, como já dito, a censura pura e simples; trata-se somente de não tapar os olhos para uma realidade que não somente nos bate o rosto, mas, literalmente, adentra os nossos lares. É a vida...

Olhando por esse prisma, a presepada da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, ainda que digna de críticas, mereceria ao menos o reconhecimento de que não é mais despropositada do que, por exemplo, alguma novela do horário nobre.