sábado, 22 de junho de 2013

O que ouvi; o que senti...

Nao há dúvidas que é cedo para analisar com profundidade  as manifestações de rua deste junho de 2013 no Brasil. Tentarei passar impressões a  partir  de testemunho do que ouvi em vagão do Metrô de São Paulo na terça-feira 18.

Na estação República embarca uma enormidade de jovens de cara pintada discutindo, conversando sobre os encontros de que participaram. A primeira observação viria de Nelson Rodrigues: nenhum desdentado! Atenhamo-nos às ideias, pois.

Um dos jovens dispara de cara: em meio a tanta coisa, os vinte centavos foram a gota d'água; não bastasse - prosseguiu -, tem o preço do quilo do tomate (R$ 12, segundo o jovem); pacote de arroz a mais de R$ 20; feijão a quase R$ 3. Gostei do preço do feijão! Desconfio que o moço não faz compras, mas mesmo assim fiquei tentado em lhe perguntar qual supermercado frequentava.

Outro rapaz afirmava que na Suécia políticos não recebiam salários, preciosa informação que não confirmei. Como seria de se esperar, o moço começou a clamar por menos impostos. Todavia, sem se atentar ao significado da palavra incoerência, o carinha passou a cobrar melhoria dos serviços públicos.

Na Sé, sobe muitíssima gente, aparentemente sem ligação com os protestos. Uma manifestante puxa papo com uma mulher, logo de início reclamando das agruras do cotidiano, dela ouvindo uma crítica genérica aos políticos: "tudo safado, tudo vagabundo, tudo farinha do mesmo saco". A moça tinha a solução: era 80% dos eleitores anularem seu voto; e o legal do movimento, contava ela para a passageira, era o repúdio aos partidos.

Merece comentário: abdicar da política, anulando votos como sugeriu a manifestante, de nada serviria, pois os poucos que ofertassem votos válidos decidiriam as eleições. E mudanças não podem ser empreendidas senão por meio da política e de seus partidos, inclusive por força legal. Muitos fazem pregação moralista antipolítica por pura ignorância; o preocupante é que parcela talvez não desprezível o faz por inclinação golpista mesmo.

Talvez não por muita coincidência, durante a viagem leio texto (se não me engano de Paulo Moreira Leite) que nos lembra do fato de, na Espanha, os jovens, após longas manifestações, terem renunciado à participação e, assim, permitido a vitória dos conservadores naquele país, os quais vêm intensificando o desmando neoliberal, causa última justamente da insatisfação que levara as pessoas às praças.

Em seguida, no ônibus, um sujeito, a despeito de, segundo palavras dele, grande paixão por futebol e da alegria pela realização da Copa no Brasil, estava furioso com os gastos excessivos com a organização do evento e construção e reforma de estádios. Muitos de fato estão tristes com a situação. Talvez porque estejam decepcionados por terem as arenas ficado prontas já em tempo da Copa das Confederações, ao contrário do que se afirmava a boca pequena, inclusive em razão de nosso já proverbial complexo de vira-latas - Nelson Rodrigues de novo!

A moçada que vi e ouvi, aparentemente desligada de organizações, conforme relatado repetia, de forma voluntária, bordões da imprensa, oposição e de grupos de direita: inflação fictícia, discurso anti-imposto e antipolítica, ódio aos partidos (de esquerda, principalmente), gastos públicos - todos temas que não por acaso poderiam desgastar qualquer governo mas são especialmente caros ao federal. Neste quadro, não parecia tarefa difícil para a direita organizada cooptar os que protestavam de boa fé.

É um caso clássico de como age a fortuna de que falava Maquiavel. O governo Dilma não só não construiu diques para dela se proteger, como ainda deixou transparecer que se sentia seguro com seus altos índices de popularidade. Por sua vez a virtù - para prosseguirmos com o florentino - parece, por enquanto, estar com a mídia e demais grupos dispostos a desestabilizar o governo brasileiro. Inculcaram pacientemente, por longo tempo, ideário conservador na cabeça das pessoas. Quando sentiram o pulsar das ruas, agiram rápido, tiveram senso de história.

domingo, 16 de junho de 2013

Perspectivas para 2014 - influências dos resultados do PIB

O até certo ponto decepcionante crescimento econômico anotado no primeiro trimestre deste 2013 trouxe ânimo para a oposição e para o colunismo que lhe dá suporte na imprensa. Com ótimos índices de popularidade, sendo Dilma Rousseff favoritíssima à reeleição em 2014, qualquer espirro traz alento às hostes oposicionistas. Mas, afinal de contas, qual é efetivamente a importância dos números reais do Produto Interno Bruto na hora da eleição?

O PIB comportou-se de forma oposta nos dois últimos pleitos presidenciais: foi fraco durante o período que antecedia a corrida de 2006, e era quase chinês na disputa de 2010. As respostas das urnas parecem sugerir que a ideia de crescimento econômico, se mostrada de forma abstrata, sem relação direta com a vida das pessoas, não influencia de forma, por assim dizer, simétrica, o resultado - no limite, talvez seja meramente um elemento a mais, de importância apenas relativa, na hora de o eleitor decidir seu voto.

Em 2006, ainda antes da derrocada do neoliberalismo, o planeta vivia uma onda de prosperidade, com meio mundo ostentando números significativos de crescimento. O Brasil seguia acanhado, e o oposicionista Geraldo Alckmin, secundado pela mídia amiga, não perdia uma oportunidade de acusar o País de àquela época "estar crescendo somente mais do que o Haiti nas Américas". A despeito das lembranças e advertências do político paulista, o então presidente Lula, candidato à reeleição, obteve vitória folgada - para não dizer massacrante - no segundo turno.

Já em 2010, nos meses que marcavam a corrida pelo Planalto, a economia brasileira, diferentemente da maior parte das economias centrais do planeta, bombava, com índices de crescimento que, anualizados, orbitavam pelos 8%, números que só seriam considerados ridículos por chineses - e olhe lá! Mas eram os brasileiros que iam às urnas, e apesar do "feel good factor", impuseram um segundo turno e premiaram a oposição com 44% dos votos, números bem melhores do que o por ela alcançado quatro anos antes, quando, segundo Alckmin e a mídia, o Haiti era aqui.

Não raro veem-se críticos aos métodos de avaliação de crescimento econômico e gente que declaradamente contesta a validade do PIB para se apurar a saúde econômica e o bem-estar social num dado país. Aos estudiosos do tema, a relação, digamos, blasé que o eleitor brasileiro parece vir tendo com a matéria seria uma boa fonte de análise.

E em 2014, será que o eleitor irá às urnas com uma tabelinha do IBGE debaixo do braço?